Monday, April 12, 2010

Yes War

Eu não sei até que ponto a reflexão sobre aquela velha pergunta: “O que você vai ser quando crescer?” pode realmente influenciar as decisões sobre o futuro das crianças. Existem, é certo, casos de prodígios ou de vocações absolutamente derradeiras, porém, tenho a convicção para aqueles que não nasceram como Mozart ou Richard Feynman, passaram por inúmeras profissões dos sonhos antes de tornarem-se profissionais na realidade. Mas a pergunta continua pertinente: qual a porcentagem dos adultos cujos longínquos desejos infantis foram realizados? Não há apenas uma resposta, até por que a porcentagem seria diferente entre pilotos de helicóptero e contadores. Mas o fato é que em algum momento, alguma influência do mundo exterior parece ter sido decisiva em cada um de nós, em maior ou menor grau, em criança ou já adolescente: a leitura de um livro, um programa de televisão, o conselho de um parente ou amigo. Para mim também foi e eu nem sabia disso na época, aliás, eu nem sabia disso até outro dia quando eu e alguns amigos resolvemos nos encontrar para relembrarmos um dos grandes momentos da nossa adolescência!Percebi, então o quanto aquilo tinha influenciado profundamente minha vida futura. Nós fomos jogar “WAR”!

O tabuleiro de “WAR”, para um geógrafo como eu pode ser considerado como uma grande heresia! Não há o menor cuidado com a escala cartográfica, com a geometria dos continentes, com as distâncias. Os limites geopolíticos então! Portugal faz fronteira com a Iugoslávia, Nova Iorque com México! Não há o menor padrão ou regra de delimitação dos “territórios”. Mas a diversão era (e é) garantida. Mas mais do que a simples busca do cumprimento de um certo objetivo, o que sempre me intrigava eram aqueles malditos territórios na Ásia, que além de misteriosos para um garoto pouco familiarizado com geopolítica global eram muito difíceis de serem controlados, dada à suas quantidades de fronteiras.

Creio que poucos de vocês, leitores, e também um dia jogadores de “WAR” (quem, afinal não foi?), sabem o que diabos é, e onde fica realmente o Omsk? O fato é que, de uma maneira ou de outra, estes lugares ficaram marcados em muitos de nós, mesmo que seja apenas pela lembrança de um nome exótico. Para alguns, entretanto, significaram um pouco mais. Sim, eu sempre quis conhecer Vladivostok! Não fazia a menor idéia de como, ou o que exatamente era esse pedaço de mapa, mas me parecia o lugar mais longe possível para visitar na terra! “Se você conhece Vladivostok, ah então deve conhecer o mundo todo!”. Este meu desejo de infância eu ainda não consegui realizar, mas posso afirmar que ele continua; firme e presente. Está entre os meus lugares favoritos em que nunca estive.

Vladivostok fica no extremo leste da Federação Russa, no Estado de Primorye (ou Estado Marítimo), banhado pelo Mar do Japão, é um lugar frio, muito frio, com temperaturas que despencam freqüentemente à –40°C, e raramente ultrapassam 20oC no auge do verão. A cidade, que possui a maior população da porção oriental da Rússia, é marcada pela desorganizada mistura da arquitetura eslava do Séc. XIX trabalhada em madeira com prédios de ângulos retos e monumentos típicos da época comunista. É também, um centro de excelência russa de desenvolvimento militar e tecnológico. A pesca e atividade portuária também são atividades econômicas importantes. Não parece, a primeira vista um destino turístico tão interessante quanto Paris ou Veneza. Há, entretanto, a alguns quilômetros ao norte, um dos santuários naturais mais ricos e belos do planeta: o parque de Sikhote-Alin. Seguindo uma cadeia de montanhas do mesmo nome, o parque é mais conhecido por ser um dos últimos habitats da terra dos tigres siberianos (Panthera tigris altaica) e também por ter sido palco de um dos eventos naturais mais dramáticos do século XX: uma série de impactos de meteoritos!



Em uma ensolarada manha do dia 12 de fevereiro de 1947, mais especificamente as 10:37h, uma chuva de bolas de fogo caiu do céu, cada uma delas tão brilhante quanto o sol. Estima-se que um grande corpo de 1000 toneladas viajando à 14 km por segundo tenha se partido, na entrada da atmosfera, em centenas de pequenos corpos que atingiram a região de Sikhote-Alin naquele dia formando uma série de 120 crateras, algumas com mais de 150 metros de diâmetro. Com o impacto, os meteoritos se estilhaçaram e cobriram boa parte da região. É possível achar, sem muito esforço, amostras de 500 gramas no solo das florestas. Na época, durante a guerra fria, houve pânico e o governo manteve o quanto pode a história em segredo, afinal parecia muito mais razoável que bolas de fogo caindo do céu em um ponto militar soviético estratégico, era um ataque americano do que rochas extraterrestres, ou então, por que não, uma invasão de exércitos amarelos.


Hoje em dia, a venda de fragmentos de meteoritos a turistas é uma fonte de renda bastante explorada localmente, e sem a ameaça tão clara dos vizinhos americanos (o Alasca fica logo ali), a região tem recebido um numero cada vez maior de turistas e estudiosos interessados em suas exuberantes florestas de Taiga e nos imponentes tigres. Quanto a mim, espero a oportunidade dedesembarcar na linda estação de trem construída em 1894, ponto final da maior linha férrea do mundo, a trans-siberiana! Não antes de fazer paradas estratégicas (e pacíficas) em Dudinka, Omsk, Aral e Tchita.

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